19/05/2009

PS TEM DEMONSTRADO SER, EM COIMBRA E NA FIGUEIRA DA FOZ, UM PARTIDO IRRESPONSÁVEL. DE GAROTOS.


Definitivamente o PS não quer ganhar eleições autárquicas, nem na Figueira da Foz, nem em Coimbra!

O ESTADO E A MATURIDADE DA NOSSA DEMOCRACIA

Chegado de Madrid onde estive a trabalho, deparo-me com a indigitação de um Juiz de Direito, Athaide das Neves, como cabeça de lista pelo Partido Socialista à Câmara Municipal da Figueira da Foz! Espantoso!Como cidadão é mais uma machadada na justiça. Onde pára a separação de poderes? À Justiça o que é da Justiça. À Gestão Pública o que é da Gestão Pública.
Um Juiz não é, nem deve ser gestor. Não foi formatado para isso. Não foi ensinado, nem tem preparação técnica para gerir.
Devo confessar que procurei descobrir, na cabeça dos "políticos" que ocupam lugar no órgão que, no Partido Socialista da Figueira da Foz, tem competência para escolher os candidatos autárquicos, as razões da escolha. Talvez tenham pensado que apresentando o PS um Juiz como candidato, os figueirenses confiariam, agora, na legalidade dos actos, marcando a diferença com a confusão e as promiscuidades nas quais se tem revelado a gestão PSD de Duarte Silva. Inacreditavelmente primário!

Pois como cidadão devo dizer ao PS na Figueira da Foz que a melhor forma de combater a corrupção é demonstrar a diferença de opções políticas, á aprovar os pacotes contra a corrupção na Assembleia da República. É não ser hipócrita e aprovar as medidas necessárias contra o henriquecimento sem causa. Não é propondo a promiscuidade entre administrar a justiça e administrar a coisa pública.
A melhor forma de combater a corrupção é formar bons políticos. É não nomear incompetentes. É não indigitar crianças para gerir o dinheiro de todos nós e colocar crianças a zelar pelos direitos fundamentais do cidadão.

O PS com este tipo de opções acaba por demonstrar à sociedade civil que não conseguiu cumprir uma das suas missões: formar gente capaz de, com sabedoria e conhecimento (e não com ignorância) exercer o poder, em nome de todos nós.
O PS, com esta escolha, acabou de deitar a toalha branca ao chão!
Ora, aos juizes não compete nem é desejável que exerçam o poder. Um juiz é formado para administrar, com total imparcialidade, a justiça.

Gostaria de perguntar se o Juiz Athaide das Neves está nessa posição de imparcialidade quando sair da Câmara Municipal, caso for eleito? Será capaz de julgar, com imparcialidade funcionários sobre os quais exerceu hierarquia? Será capaz de julgar actos de vereadores que foram seus?
E o que dizer do conhecimento que tem de processos atinentes a pessoas que podem vir a ser seus adversários? E se perder as eleições? Assumirá o seu mandato na oposição, recebendo apenas senhas de presença? Mas nesse caso exercerá a Magistratura às segundas e terças e às quartas e quintas o mandato na Câmara? Pensou em tudo isto o PS?
É óbvio que se o Juiz Athaide das Neves perder as eleições não poderá assumir o lugar que democraticamente os eleitores lhe confiarem, na oposição. Neste caso o PS hipotecará, mais uma vez, uma oportunidade de construir, pelo menos, uma oposição forte e com um lider. Os socialistas ainda não perceberam que sofrem da mesma doença que o Benfica. O Benfica é o clube que mais dinheiro gasta em contratações e é o que pior constroi equipas. Aliás, o Benfica não sabe construir equipas. O PS também não.

O JUIZ ATHAIDE NÃO PODE SER
CANDIDATO A PRESIDENTE DE CÂMARA

A Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, além de ser uma Lei com valor reforçado, é para todos os efeitos, uma lei especial para efeitos da eleição dos órgãos autárquicos.
Esta Lei, no seu artigo 6.º, n.º 1 alinea e) cria uma INCOMPATIBILIDADE GERAL de eleição para órgãos autárquicos para os Juizes e os Procuradores-Gerais Adjuntos.
Ora, as Leis Orgânicas têm valor reforçado precisamente porque que carecem da aprovação da maioria de dois terços dos deputados em funções (maioria qualificada).

Por outro lado, as Leis Orgânicas estão sujeitas às regras da Exclusividade, Parametricidade e Primariedade. Ou seja:

Regra da Exclusividade : Revela-se sobretudo na categoria das leis orgânicas. A emanação de uma lei orgânica sobre estas matérias, impede que sobre elas incida uma lei simples da Assembleia da Repúblic.

Regra da Parametricidade: Nos casos em que uma lei é um pressuposto normativo necessário de outras leis - Leis de autorização , Leis-Parâmetro de decretos-lei ou de decretos legislativos autorizados - Leis de Bases, parâmetro do decreto-lei ou do decreto legislativo de desenvolvimento. A não observação desta regra implica uma inconstitucionalidade e uma ilegalidade (violação da lei com valor paramétrico).

Regra da Primariedade: Leis com valor reforçado, são aquelas que foram votadas por uma maioria qualificada, aquelas que constituem pressuposto necessário de outras e aquelas que devam ser respeitadas pelas outras leis.

Ora a Lei que aprova o Estatudo dos Magistrados Judiciais e a que aprova o Estatuto do Ministério Público são apenas Leis Ordinárias. Mas como se isso não bastasse, mesmo que fossem igualmente Leis Orgânicas, e não são, a Lei Orgânica n.º 1/2001 é Lei especial no que à eleição dos órgãos autárquicos diz respeito, logo inderrogável por qualquer Estatuto de organização de uma qualquer profissão.

Mas, além de tudo, a Lei que aprova o Estatuto dos Magistrados Judiciais é uma mera Lei ordinária, pelo que jamais prevaleceria sobre uma Lei Orgânica.
Significa isto dizer que os Magistrados em geral não podem ser eleitos para quaisquer órgãos autárquicos, mesmo que autorizados pelo seu Conselho Superior.
Outros cargos políticos haverá, para cujo exercício não haja uma Lei Orgânica limitativa a criar-lhes uma incompatibilidade genérica, pelo que, para esses casos, os Magistrados poderão vir a ser autorizados pelo seu Conselho Superior, mas nunca para o desempenho de funções em órgão autárquico.

E SE O JUIZ PEDIR SUSPENSÃO?

Mais uma vez julgamos difícil esta sustentação, sobretudo atendendo ao novo quadro jurídico que manteve os senhores magistrados em regime de nomeação.

Bem sei que o Conselho Superior da Magistratura tem tido um entendimento lato sobre os pedidos de licença sem vencimento de longa duração, no sentido de o vínculo mantido ser muito ténue, motivando, portanto, o afastamento desta incompatibilidade geral.

Não posso estar mais em desacordo. Por razões jurídico-legais e por razões éticas e morais.

Significa, portanto, que qualquer suspensão pode afastar apenas o Juiz do exercício da magistratura por um certo período de tempo, mas ele não deixa, porém, de ser Magistrado.
Ora, a Lei Orgânica 1/2001 o que fixa é uma incompatibilidade para os Magistrados Judiciais e os Procuradores-Gerais, não permitindo que sejam eleitos para qualquer órgão autárquico.
Não diz que o que é incompatível é o exercício da magistratura! A incompatibilidade que existe é para quem é Magistrado. Ponto final.

Apenas se o Juiz Athaide das Neves deixasse a carreira da Magistratura, ou se aposentasse, ou seja, se ele ficasse sem qualquer ligação jurídica ou vínculo laboral e jurídico-funcional à carreira da Magistratura, deixando, pois, de ser Magistrato, é que cessaria a incompatibilidade.
Qualquer outro entendimento corresponde a uma fraude à Lei Orgânica n.º 1 /2001, e ao seu espírito.
Nem qualquer pedido de suspenção de actividades ou mesmo uma qualquer licença sem vencimento, mesmo que seja de longa duração, extingue vínculos. Aliás, apenas o suspende, como resulta de forma clara e expressa da letra da lei.

A licença sem vencimento mantém o vínculo, pelo que, no caso de se tratar de uma licença de longa duração, o Juiz de Direito, Athaide das Neves, daqui a um ano poderá regressar à Magistratura e quiçá julgar processos de alguns dos seus opositores eleitorais, caso perca, este ano, a pugna eleitoral.
É isto desejável? Não é isto promiscuo? Como cidadão entendo que é claramente. Por essa razão é que o legislador fixou uma Incompatibilidade Geral na citada Lei Orgânica.

* Professor de Direito
Luis António Bettencours

Sem comentários: