02/06/2009

ÁFRICA NÃO PODE SER VISTA COMO A GALINHA DOS OVOS DE OURO. ATÉ PORQUE NÃO É.



A crise financeira e económica global irá afectar, previsivelmente, os países em desenvolvimento (PED) de uma forma particularmente aguda e perniciosa, uma vez que estes países estão, à partida, menos equipados para protegerem as suas economias, combaterem os efeitos da crise e responderem de forma adequada a uma combinação complexa de vulnerabilidades internas e externas.

A crise financeira veio juntar-se aos efeitos nefastos da crise alimentar e agrícola, que levou, em 2008, a um agravamento das despesas para vários países importadores líquidos de bens alimentares.
Em África, a subida dos preços dos bens alimentares trouxe uma lição importante: o choque afectou directamente os grupos e agregados familiares mais pobres e causou também problemas políticos, tensões sociais e desequilíbrios macro-económicos (por exemplo, na balança de pagamentos e nos orçamentos de Estado), demonstrando a interdependência dos problemas.

Para os países exportadores de petróleo, a volatilidade dos preços desta matéria-prima, em particular desde o início de 2009, alertou para a vulnerabilidade do crescimento baseado em economias de enclave, que poucos reflexos têm na criação de emprego ou na geração endógena de riqueza.

Embora o impacto da crise global esteja ainda, em grande medida, por avaliar nestes países, as estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam para um custo de mil milhões de dólares em perdas de crescimento e o Banco Mundial alerta para a possibilidade da crise acrescentar mais 53 milhões de pessoas àquelas que actualmente vivem com menos de dois dólares por dia.

As reservas da totalidade do continente africano equivalem às da Noruega, o que demonstra a incapacidade para responder a uma crise prolongada.

Os países africanos, em particular, estão numa posição ainda menos favorável, dada a evolução lenta dos indicadores sociais (que não têm correspondido às altas taxas de crescimento económico da generalidade do continente nos últimos anos) e a própria estrutura das economias: pouco diversificadas e muito dependentes do exterior. Se juntarmos a estes factores a existência generalizada de fenómenos de fragilidade do Estado, que se manifestam nas fracas capacidades institucionais de resposta às necessidades básicas dos cidadãos, poderemos antecipar os efeitos negativos da presente crise nas perspectivas de estabilidade política e económica destes países.
As previsões de crescimento reflectem esta evolução: as economias avançadas terão um crescimento negativo acima de 1,7% em 2009; nas economias emergentes e em desenvolvimento (excluindo a África Subsaariana) a queda será de 6,3% para 3,3% de crescimento do PIB; e na África Subsaariana as projecções do FMI apontam para uma descida de pouco mais de 5% em 2008, para cerca de 3,2% – cerca de 3 pontos percentuais abaixo dos números previstos há cerca de um ano .

A crise terá previsivelmente efeitos negativos de longo-prazo, especialmente para países fortemente dependentes dos recursos externos, como acontece com a maioria dos Estados africanos. Segundo dados recentes, os Países Menos Avançados, de uma forma geral, registam uma grande dificuldade em mobilizar poupanças domésticas e em as aplicar de forma produtiva (a poupança interna equivale a menos de 15% do PIB), conjugado com um grande peso dos fluxos externos na formação de capital fixo (a ajuda ao desenvolvimento e o IDE representam cerca de dois terços, em média, do investimento na economia).

Por enquanto, a procura de soluções e a disponibilização de recursos para as economias emergentes e para os países mais pobres parece não ser uma prioridade internacional. Para que as medidas acordadas tenham efeitos positivos nos PED, é necessário que:
I. Todas as medidas de resposta à crise económica e financeira tenham em consideração as necessidades dos países em desenvolvimento, nomeadamente dos países menos avançados e dos países de baixo rendimento (Least Developed Countries e Low Income Countries);
II. O desenvolvimento seja considerado um elemento central da governação global, uma vez que a crise veio demonstrar não existir separação entre as preocupações económicas globais e as de desenvolvimento;
III - Exista uma abordagem de inclusão na governação económica mundial, uma vez que as soluções globais nunca poderão ser verdadeiramente abrangentes se não forem também inclusivas de diversas sensibilidades e interesses;
IV. Exista uma vontade política forte e uma liderança efectiva na implementação das acções necessárias.
Ora aqui está um excelente tema para os senhores e as senhoras candidatos a deputados europeus discutirem, pois o espaço europeu tem obrigatória e necessariamente de encontrar, com criatividade e inteligência, condições de diálogo com os restantes continentes.

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